Com risco de rompimento, vizinhos de barragem em Rio Acima temem 'nova Mariana'

Com risco de rompimento, vizinhos de barragem em Rio Acima temem 'nova Mariana'

Sob risco considerado iminente, represas de rejeito de minério mantidas em Rio Acima por mineradora do grupo CSN tiram sono de comunidades estabelecidas abaixo das estruturas, que podem contaminar o Rio das Velhas. Ultimato judicial mobiliza maquinário pesado e técnicos

Após alerta, EM flagra intensificação de trabalhos em estruturas sob risco de vazamento em Rio Acima

O risco de rompimento de duas barragens de rejeito de minério em Rio Acima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, classificado como “iminente” pelo Ministério Público estadual, se traduziu em grande movimentação de técnicos e máquinas nas estruturas, mas também aumentou o medo entre moradores que vivem abaixo das represas ameaçadas. Na sexta-feira, como o Estado de Minas noticiou, a Justiça concedeu liminar ao MP decretando a interdição de lançamentos nos dois reservatórios e obrigando a Minérios Nacional, mineradora do grupo da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), a garantir em até 15 dias a estabilidade das represas, chamadas B2 e B2-Auxiliar, por apresentarem instabilidade e até vazamentos, segundo o MP. “A gente escuta falar que as barragens podem estourar no alto da serra e, se isso acontecer, temos medo de uma nova Mariana, já que o córrego das barragens passa a 50 metros de onde a gente mora”, desabafa a caseira Luzia Rodrigues Teixeira, de 44 anos.

Ontem, a equipe de reportagem do EM atravessou estradas rurais e fazendas para conseguir chegar até as duas estruturas em estado crítico, uma vez que as vias comuns são cercadas de outras mineradoras, que não permitem tráfego sem autorização. Do alto de um dos morros, foi possível flagrar intensa movimentação de técnicos, operários e vistoriadores de diversas companhias atuando sobre as duas estruturas. Caso ocorra um rompimento, parte ou a totalidade dos quase 9 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro contidos nos reservatórios seriam injetados no vale do pequeno Ribeirão Fazenda Velha, atingindo, em menos de sete quilômetros, o Rio das Velhas e, 23 quilômetros depois, a área de captação da Copasa em Bela Fama, responsável por abastecer cerca de 50% da Grande BH. O alerta lançado por promotores e a mobilização em torno da ameaça em Rio Acima coincidem com as discussões do 8º Fórum Mundial da Água, aberto no domingo em Brasília para abordar exatamente a preservação e o uso racional dos recursos hídricos.

De acordo com a CSN, cinco moradores de uma residência rural seriam os únicos “no raio de influência das barragens B2 e B2-Auxiliar”, mas a proximidade do vale do Ribeirão Fazenda Velha com o Rio das Velhas faz com que moradores de Rio Acima, por exemplo, a 11 quilômetros, temam por suas famílias e negócios. O marceneiro Dirceu Aparecido dos Santos, de 46 anos, trabalha há cerca de três anos a menos de 30 metros do Rio das Velhas. “Por duas vezes soube de enchentes – uma em 1998 e outra em 2011. Em ambas nosso bairro foi lavado pela água e vizinhos perderam tudo. Hoje estou com muito medo, pedindo pelo amor de Deus para a fiscalização não deixar isso acontecer, porque senão vou perder o ganha-pão da minha família. Um acidente com lama como em Mariana acabaria com minha marcenaria”, afirma.

Os promotores de Justiça Cláudia de Oliveira Ignez e Francisco Chaves Generoso, da comarca de Nova Lima, autores da ação civil pública contra a mineradora, cobram atitudes imediatas. “A situação identificada reflete risco iminente e elevado de gravíssimos danos sociais e ambientais, entre os quais destacam-se o risco de perdas de vidas humanas, soterramento de dezenas de quilômetros de vegetação, edificações, estradas, cursos d’água, nascentes, mananciais de abastecimento e de danos à fauna”, alertam.

De acordo com os laudos técnicos que os promotores receberam, foi constatado que as barragens não apresentavam estabilidade geotécnica e hidráulica. Uma fragilidade que seria visível, principalmente após o aparecimento de vazamentos na barreira de contenção, “indícios de risco iminente de ruptura”. Foi determinado também pela Justiça que seja feito todo o planejamento de emergência para evacuação de vítimas e precauções ambientais, bem como a desmontagem das estruturas. Caso a empresa não cumpra as determinações impostas pela Justiça na última sexta-feira, poderá pagar multa diária R$ 30 mil, até o montante de R$ 1 milhão.

O Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema) informou que a unidade da Minérios Nacional no Complexo de Fernandinho tem quatro barramentos: duas barragens de contenção de rejeitos (Barragem B2 e Barragem B2-Auxiliar) e dois diques com finalidade de clarificação de água (Barragem Ecológica I e Barragem Ecológica II). A empresa já foi autuada em situações específicas por não atender a deliberações normativas do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam).

A empresa também foi autuada em 21 de agosto de 2017 por não realizar as auditorias técnicas extraordinárias ano-base 2016 e não inserir no Banco de Declarações Ambientais (BDA), da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), as Declarações Extraordinárias de Condição de Estabilidade das Barragens B2 e Auxiliar B2 nos prazos especificados.

Na declaração de condição de estabilidade apresentada à Feam no BDA foi inserida a seguinte informação pelo auditor independente: “À luz das observações da inspeção de campo, associadas à análise dos dados disponibilizados pela Minérios Nacional, do qual permitiu-se que se realizasse uma avaliação dos dados de monitoramento, comportamento da estrutura em epígrafe, associado às análises de estabilidade, a Golder Associates não garante a estabilidade da Barragem B2 Auxiliar”.

O trabalho, que chegou às mesmas conclusões em relação à Barragem B2, sustenta ser necessário que haja um estudo mais aprofundado e detalhado dos parâmetros dos rejeitos depositados. “É imperativo que não haja nenhuma disposição de rejeitos na estrutura e que o nível do reservatório seja controlado conforme atualmente”, recomenda o relatório da auditoria. O Sisema informou que acompanha as ações de regularização, fiscalização e gestão de informações sobre essa situação.

A Minérios Nacional informou, por meio da assessoria de imprensa da CSN, que “está conduzindo todas ações para atender ao plano de emergência da unidade de Fernandinho”. “Nos próximos 15 dias, a empresa fará a instalação de mais uma sirene de alerta. O processo para realizar o treinamento dessas pessoas está em fase de planejamento e será feito dentro do prazo. É importante lembrar que a empresa possui sistematizadas ações emergenciais, caso necessárias, com dispositivos de comunicação, incluindo sonoros, como a sirene que já está instalada em área próxima à barragem. Além disso, os colaboradores diretos e terceirizados da Minérios Nacional passaram por treinamentos para situações de emergência”, informou.

Fonte: Estado de Minas

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