Por que a China quer deixar de ser 'a lixeira do mundo' e como isso afeta outros países

Por que a China quer deixar de ser 'a lixeira do mundo' e como isso afeta outros países

Trabalhadora caminha entre embalagens plásticas em centro de reciclagem em Jiangsu, na China

Uma parte considerável do lixo mundial vai parar na China, o principal importador mundial de muitos tipos de materiais para reciclagem, como plástico, papel e metais. Com uma demanda cada vez maior por produtos plásticos e de papelão, o país busca material tanto internamente quanto no mercado internacional.

Segundo dados das Nações Unidas, fabricantes chineses e de Hong Kong importaram 7,3 milhões de toneladas de plástico para reciclarem em 2016. O material veio principalmente de países ricos, como Japão EUA e nações da União Europeia, e equivale a 70% de todo o plástico descartado no mundo naquele ano.

O Brasil também contribuiu com uma pequena parte deste total – em 2017, o país vendeu para a China 25,3 mil toneladas de papeis para reciclagem. Também despachou para o país asiático 14,6 mil toneladas de resíduos e restos de metais para reciclagem, principalmente cobre (12,3 mil toneladas), alumínio e aço. Os dados são do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), levantados a pedido da BBC Brasil.

Esse fluxo, entretando, deve mudar a partir deste ano, já que a China decidiu deixar de receber boa parte desse material. Seguindo Pequim, o objetivo é proteger o meio ambiente do país do “lixo ‘sujo’ e, inclusive, perigoso” que hoje chega ali. As autoridades também dizem que a produção nacional de lixo reciclável já é suficiente para atender a demanda da indústria local.

Proibição e pânico

Um julho passado, o governo chinês anunciou a proibição (a partir de 2018) da importação de certos tipos de materiais para reciclagem – o que preocupou vários países do mundo.

A medida incluiu novas regras sobre os tipos de materiais recicláveis que poderiam ser importados pelo país, que entrariam em vigor no último dia 1º, e notificar a Organização Mundial do Comércio (OMC) de que baniu a entrada no país de 24 categorias de materiais e de despejos sólidos.

A campanha do governo mira no que os chineses chamam de yang laji, o “lixo estrangeiro”: plásticos recicláveis, rejeitos têxteis e certos tipos de papel.

O país asiático continuará importando papelão, por exemplo. Mas deverá ser “muito mais limpo” do o atual, e livre de resíduos como terra, poeira e pedregulhos.

Diante do pânico global provocado pelo anúncio, a OMC e os países exportadores apelaram à China para que adiasse a proibição e abrisse a possibilidade de um “período de transição” de cinco anos.

De acordo com o site especializado Chinadialogue.com, as negociações continuam – Pequim concordeou, por exemplo, em adiar o começo das novas regras até o dia 1º de março.

“A indústria (de materiais recicláveis não estava preparada para o súbito anúncio do governo chinês em julho, de proibição total das importações de papel mesclado (com diferentes tipos de fibras e cores) e uma redução do máximo permitido de materiais contaminados a 0,3% de cada lote”, diz reportagem do Chinadialogue.com.

Dependência

Os temores provocados pelo anúncio de Pequim refletem a dependência mundial da China para o manejo do lixo.

Segundo dados da ONU, o comércio desses produtos com a China e Hong Kong movimentou US$ 21,6 bilhões no ano passado.

União Europeia e Estados Unidos são os principais exportadores.

Só esses últimos exportaram para a China 13,2 milhões de toneladas de papel para reciclagem e 1,4 milhão de toneladas de plástico no ano passado.

Grande parte do papel e do papelão importado pela China se transforma em caixas para embalar produtos – tanto os vendidos no país quanto os exportados.

As empresas dos países exportadores, como era de se esperar, enfrentam agora o desafio de encontrar o que fazer com o material quando a proibição começar a vigorar.

Tanto a indústria de reciclagem quanto os governos dos países ricos estão sob enorme pressão, uma vez que a coleta deste tipo de lixo pode deixar de ser economicamente viável.

Em dezembro, o ministro do Meio Ambiente, Michael Gove, admitiu em uma sessão do Parlamento que não sabia qual seria o tamanho do impacto da proibilçai chinesa nas empresas do Reino Unido. Em 2016, o país exportou 400 mil toneladas de resíduos plásticos para a China.

Alternativas

O que acontecerá então com a montanha de lixo reciclável que a China deixará de receber?

Segundo o Escritório Internacional de Reciclagem (BIR, na sigla em inglês), organização sediada em Bruxelas e que representa a indústria em nível global, novos mercados para esses produtos estão sendo buscados. Países como Tailândia, Vietnã, Camboja, Malásia, Índia e Paquistão são possíveis destinos para o lixo reciclável.

“Esses países já estão posicionados no mercado, mas certamente não têm a mesma capacidade que a China”, disse o diretor-geral do BIR, Arnaud Brunet, à revista especializada Recycling International.

Ele acrescenta que as leis regulamentação desses países não são tão desenvolvidas quanto as chinesas.

Brunet diz que o ano de 2018 será “decisivo” para a indústria de reciclagem.

“O que eu sinto é que não haverá retrocessos, que nossa indústria tem que se adaptar, seguir as regras e encontrar opções alternativas para o longo prazo”, diz ele.

Essas alternativas poderiam incluir a queima de materiais para a geração de energia, ou a disposição em aterros sanitários. Essa última opção é menos adequada, já que esses materiais podem provocar incêndios.

Especialistas dizem que as medidas de Pequim poderiam ser um “ponto de inflexão” na nossa relação com esses materiais e na forma como os utilizamos.

Segundo eles, os desafios enfrentados agora pelos países que dependem da China para resolver seus problemas ambientais oferecem uma oportunidade para se pensar em novos programas de reciclagem e novas formas de utilizar as toneladas de produtos plásticos e de papel que são descartadas hoje.

Fonte: UOL

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